Com a decisão, processo do triplex terá de reiniciar da estaca zero. Condenação do ex-presidente já tinha sido anulada por decisão do ministro Edson Fachin
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A sentença que condenou Lula segue anulada por outra
decisão, determinada pelo ministro Edson Fachin, que apontou a incompetência da
Justiça Federal do Paraná para analisar os processos do petista e tornou sem
efeito as condenações pela Operação Lava Jato de Curitiba.
Com a decisão desta terça, a Segunda Turma anulou todo o
processo do triplex, que precisará ser retomado da estaca zero pelos
investigadores. Para o ministro Edson Fachin, vencido no julgamento, a decisão
poderá levar à anulação de todas as sentenças proferidas por Moro na Operação
Lava Jato.
A decisão resultou do
julgamento pela turma de uma ação impetrada em 2018 pela defesa de Lula.
A maioria a favor da ação do ex-presidente foi formada
com a mudança de voto da ministra Cármen Lúcia. Em 2018, quando o julgamento se
iniciou, ela tinha rejeitado a ação, mas agora seguiu o entendimento dos
colegas Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski.
Cármen Lúcia entendeu que novos elementos mostraram que a
atuação de Moro não foi imparcial, favoreceu a acusação e, portanto, segundo
avaliação da ministra, houve um julgamento irregular.
A suspeição não é automática
para outros processos de Lula — a defesa terá, por exemplo, que questionar os
outros casos na Justiça. Moro não foi o autor da condenação de Lula no caso do
sítio de Atibaia, mas recebeu a denúncia e transformou o petista em réu nesse
caso.
Para o relator da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal
Federal, ministro Edson Fachin, a suspeição de Moro tem efeitos que vão além do
caso de Lula e abre brecha para que advogados de condenados na Lava Jato
questionem na Justiça a conduta do ex-juiz e apontem outras sentenças como
ilegais.
O voto da ministra
Cármen Lúcia justificou que
novos elementos juntados ao processo permitiram uma nova análise sobre os fatos
levantados pela defesa de Lula que apontavam uma conduta irregular do juiz na
sentença.
De acordo com a ministra, ninguém deve ser perseguido por
um juiz ou tribunal nem condenado por determinado voluntarismo.
Segundo ela, há elementos de que houve uma
"confusão" entre o juiz e o Ministério Público, que é o órgão
acusador.
Cármen Lúcia afirmou que não estava considerando diálogos
obtidos por hackers que demonstrariam uma ação combinada entre o juiz Sergio
Moro e procuradores da Operação Lava Jato e afirmou que reconhecer a
parcialidade de Moro na condenação de Lula não significa que isso terá impacto
em outros casos da Operação Lava Jato.
“Tenho para mim que estamos julgando um habeas corpus de
um paciente [Lula] que comprovou estar numa situação específica. Não acho que o
procedimento se estenda a quem quer que seja, que a imparcialidade se estenda a
quem quer que seja ou atinja outros procedimentos. Porque aqui estou tomando em
consideração algo que foi comprovado pelo impetrante relativo a este paciente,
nesta condição", disse a ministra.
Segundo ela, "essa peculiar e exclusiva situação do
paciente neste habeas corpus faz com que eu me atenha a este julgamento, a esta
singular condição demonstrada relativamente ao comportamento do juiz
processante em relação a este paciente”.
"Não estou portanto fazendo algum tipo de referência
à Operação Lava Jato, mas sobre um paciente julgado e que demonstra que, em
relação a ele houve comportamentos inadequados e que suscitam portanto a
parcialidade", afirmou a ministra.
Nunes Marques
Antes de Cármen Lúcia, votou o ministro Nunes Marques, que, no último dia 3, interrompeu o julgamento ao pedir vista (mais tempo para analisar o processo).
Marques rejeitou a ação de Lula, o que, naquele momento,
formou um placar de 3 a 2 contra a declaração de suspeição de Moro. Com a
mudança de voto, Cármen Lúcia alterou o resultado, com 3 a 2 a favor do
acolhimento da ação de Lula.
Nunes Marques considerou que os fatos colocados pela
defesa de Lula foram "enfrentados" pela Justiça e que não cabia
reanalisá-los.
Segundo ele, os pontos relacionados como argumentos na
ação — "condução coercitiva, quebra de sigilo, divulgação dos áudios, teor
de informações prestadas ao STF pelo magistrado, fundamentos declinados por
ocasião do recebimento da denúncia, postura do magistrado, obras literárias
tendo como tema Operação Lava Jato, participação de magistrado em eventos
políticos, pré-disposição em condenar do magistrado, considerações do
magistrado em artigo acadêmico" — já foram apreciados pela Justiça.
Para Nunes Marques, é preciso ter provas para se declarar
uma suspeição.
“No meu entendimento, todos esses fatos já foram objeto
de análise em todas as instâncias do Poder Judiciário. É inviável a reanálise
de três fundamentos nesta via eleita. Na hipótese de suspeição, é preciso provas.
”
No voto, Marques comentou as manifestações de Gilmar
Mendes e Ricardo Lewandowski a respeito de diálogos obtidos por hackers que demonstrariam
uma ação combinada entre o juiz Sergio Moro e procuradores da Operação Lava
Jato.
"Se o hackeamento fosse tolerado, mesmo que para a
defesa, ninguém estaria seguro de sua intimidade, de seus bens, de sua
liberdade. No caso em exame, as provas são materiais obtidos por hackers. Tenho
que são absolutamente inaceitáveis tais provas, por serem frutos diretamente de
crimes. Entender de forma diversa seria uma forma transversa de legalizar a
atividade hacker no Brasil."
Gilmar Mendes
Após o voto de Nunes Marques, o ministro Gilmar Mendes
pediu a palavra, contestou os principais pontos colocados pelo colega e voltou
a defender que houve parcialidade de Moro.
Mendes discordou das questões processuais apontadas por
Nunes Marques, pegou pontos da defesa e aprofundou trechos do voto que já havia
apresentado. Ele afirmou que não se pode permitir uma combinação entre juiz e o
ministério público.
Mendes disse que habeas corpus pode ser usado para
declarar ilegalidade em qualquer julgamento, citou que houve irregularidades no
processo como a condução coercitiva, a interceptação do escritório da defesa do
ex-presidente. e citou nominalmente Nunes Marques várias vezes.
Mendes afirmou ainda que independente do resultado do
julgamento o caso já representou a desmoralização da Justiça.
“Não se trata de ficar brincando de não conhecer de
habeas corpus. É muito fácil não conhecer de um habeas corpus. Atrás, muitas
vezes, da técnica de não conhecimento de habeas corpus, se esconde um covarde.
E Rui falava: 'O bom ladrão salvou-se, mas não há salvação para o juiz
covarde'”, afirmou.
O ministro reforçou que julgou com as provas do processo.
“Caráter seletivo e manipulado dos vazamentos não apaga os registros de quando
[Moro] virou herói nacional. Tomou como sinal de apoio protestos pela prisão de
Lula. Encerro reafirmando meu voto e destacando que em nenhum momento – e disse
isso claramente – não vou usar as informações de hackers para falar deste caso.
Não me façam nenhuma injustiça. Agora, acho que esses fatos são historicamente
relevantes”, declarou.
Ricardo Lewandowski
Depois de Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, que já
havia votado em 2018, também pediu a palavra. Rememorou pontos de seu voto e
reafirmou que um habeas corpus pode ser usado para discutir a suspeição — em contraponto
a Nunes Marques.
"Quero tornar pública a minha convicção e já
externei no voto que o material arrecadado na Operação Spoofing [que levou à
prisão dos hackers] foi periciado. Tanto foi que serviu para denúncia e
condenação dos hackers. Nenhum dos diálogos foi desmentido. E não seria
possível perícia, porque apagaram, deletaram as mensagens", afirmou
Lewandowski.
Segundo o ministro, "os áudios são tão evidentes que
dispensam qualquer tipo de perícia, no sentido de atestar a autenticidade do
material arrecadado na Operação Spoofing".
"Há um princípio que diz que textualmente fatos
notórios independem de prova", declarou.
Edson Fachin
O ministro Edson Fachin reafirmou o próprio voto. Ele
disse que a ação de Lula deveria ser rejeitada e que os fatos de agora já
estavam presentes desde 2018, quando o processo começou a ser analisado na
Corte.
“Não há absolutamente qualquer argumento novo em meu modo
de ver, apto a justificar o efeito revisional. Não há nenhum elemento inédito
nessas alegações. Desde a impetração os elementos são esses que aí estão”,
afirmou.
O ministro fez uma defesa da Operação Lava Jato. “O que a
Lava Jato desvelou é um grave problema criminal em órgãos e instituições
públicas. O que os diálogos [obtidos pelos hackers] podem estar a revelar é a
suspeita de um grave problema ético e a ausência de limites — contato entre as
partes e o magistrado", declarou.
Fachin disse que a suspeição de Moro poderá implicar a
anulação de todas as sentenças do ex-juiz. O ministro admitiu que os fatos são graves,
mas cobrou uma discussão sobre a legalidade das mensagens.
“Entendo como ilegal a realização de conversas ex-parte,
fora de parâmetros constitucionais. Insisto no ponto do prejuízo porque a
decisão prolatada efetivamente esvazia o objeto do habeas corpus e tenho o
receio de que o uso do material do ponto de vista retórico tenha por efeito
prático a anulação de todos os casos em que a amizade entre o juiz e o
ex-procurador ocorreu. A amizade do juiz com a acusação pode ter o condão de
anular todos os processos julgados pela 13ª Vara Federal", declarou.
Segundo Fachin, não basta dizer que trata-se de um caso
específico. "É preciso ir além e reconhecer que essa decisão poderá
implicar a anulação de todos os processos. Os fatos são graves e se forem verdadeiros
mesmo, a solução pode ser a nulidade. Mas não posso admitir que isso seja feito
sem que as dúvidas da integridade do material sejam analisadas, sem que haja um
mínimo de instrução competente."
"Receio que, a pretexto de combater as ilegalidades
reais ou alegadas na Operação Lava Jato, com este julgamento se possa incorrer
na mesma ilegalidade que possa rebater”, disse.
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