Sentença
afeta a vida de 54 famílias na mesma área em que a irmã Dorothy Stang foi
assassinada, em 2005
É
tenso o clima no Lote 96, em Anapu, município paraense onde, em fevereiro
de 2005, a missionária Dorothy Stang foi assassinada por defender o direito à
terra dos camponeses. É que a Justiça de Altamira (Vara Agrária) determinou a
reintegração de posse de uma área onde, há 11 anos, moram 54 famílias. Os
camponeses dizem que vão permanecer no local. Ou seja, vão resistir. O Lote 96
fica na Gleba Bacajá. Os camponeses dizem que a área, que é terra pública, foi
reivindicada por um fazendeiro, como sendo parte de sua propriedade.
“Ele
vendeu a terra e os novos proprietários promoveram todos os ataques contra as
famílias. Por fim, a Justiça deu ganho a eles”, disse Erasmo Alves
Teófilo, camponês, defensor dos direitos humanos e que representa as
famílias. A decisão do juiz é datada de 28 de abril deste ano.
“Não
vamos aceitar reintegração de posse no Lote 96. Essa terra é da comunidade. Não
vamos aceitar que nosso cacau, açaí, pimenta e a nossa lavoura seja engolida e
destruída pelo gado”, afirmou. Erasmo informou que a comunidade tem sofrido
ataques. “O último agora foi a queima da casa de farinha da comunidade, um
ataque direto, feito por pistoleiros”.
“A
terra é pública, da União, e o juiz deu reintegração de posse em favor do
grileiro e contra a comunidade”, diz ainda Erasmo. Por causa da sua luta pelo
direito à terra, Erasmo está ameaçado de morte. E foi incluído no Programa
de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, da Secretaria de
Estado de Segurança Pública e Defesa Social (Segup).
Ele e
a família tiveram que deixar o local há cinco meses. Ainda segundo Erasmo, a
Segup fez uma análise de segurança e entendeu que não é seguro ele retornar ao
lote neste momento. Mesmo sob ameaça de morte, Erasmo autorizou que seu nome
fosse publicado nesta matéria.
“A comunidade
não vai abrir, ninguém vai sair. Não acatamos ordem judicial, a não ser a ordem
da comunidade de ficar na terra. Vamos resistir”, garantiu.
“Ele
vendeu a terra e os novos proprietários promoveram ataques contra as famílias.
Por fim, a Justiça deu ganho a eles”, disse Erasmo Alves Teófilo,
camponês, defensor dos direitos humanos e que representa as famílias. “Não
vamos aceitar reintegração de posse no Lote 96. Essa terra é da
comunidade. Não acatamos ordem judicial, a não ser a ordem da comunidade
de ficar na terra. Vamos resistir”
Ação
diz que dono da terra passou a sofrer ameaças de invasão
A ação de reintegração de posse com pedido liminar foi ajuizada por Antônio
Borges Peixoto e tem como objeto do pedido a proteção possessória do imóvel
localizado no lote 96 da Gleba Bacajá com área superficial de 3 mil hectares,
no município de Anapu.
Em
síntese, a ação diz que o requerente é legítimo proprietário e possuidor do
imóvel, onde explora a agropecuária. Mas que, desde junho de 2013, passou a
sofrer ameaças de invasão. E que, em setembro de 2013, havia arrendado parte da
área de pastagem de seu imóvel para fins de exploração pecuária com permissão
para os arrendatários colocarem no pasto 250 cabeças de gado, e que a invasão
avançara com a construção de um barraco próximo à sede da fazenda e que os
ocupantes estariam fazendo ameaças aos funcionários da fazenda.
Na
sentença, o juiz Antônio Fernando de Carvalho Vilar escreve que a
terra cumpre os requisitos da função social e que faz jus o autor à proteção
possessória pretendida.
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Lote é o mesmo onde missionária Dorothy Stang foi assassinada, em 2005 (Tomaz Silva/Agência Brasil) |
“De
acordo com as inspeções judiciais realizadas por este juízo, verifica-se que os
atuais ocupantes da área litigiosa, ao contrário do autor, não estão dando a
devida função social à área, não há exploração da terra de modo saudável para a
manutenção de suas subsistências, posto que salvo minguadas exceções dentre os
ocupantes, verificou-se a inexistência do desenvolvimento de lavouras de
subsistência”, diz a sentença.
Camponeses não cumpriram função
social da terra, diz sentença
O juiz destaca ainda que a ocupação se iniciou nos idos de 2013, “e, em que
pese o esforço das lideranças para se estabelecerem e produzir no local, o fato
é que os requeridos não conseguiram realizar a escorreita exploração da terra.
Não foi verificado, por parte dos requeridos, o desenvolvimento de qualquer
atividade que justificasse o cumprimento das funções sociais da posse, salvo
poucas exceções”.
Destaca ainda que o município
de Anapu é alvo de constantes conflitos sociais pela posse da terra,
“conflitos estes que inclusive já chegaram a ter repercussão internacional,
como o fatídico caso envolvendo a irmã Doroty Stang… Sendo que, não por outro
motivo, este juízo se deslocou várias vezes até a área, dentre outros, para
mediar os conflitos pela posse da terra”, diz.
Segup
já repassou para a PM viabilizar as ações policiais competentes
A Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Pará (Segup) informa que
já foi notificada judicialmente quanto à situação do Lote 96 da Gleba Bacajá,
no município de Anapu, e já repassou para a Polícia Militar viabilizar as
ações policias competentes, seguindo os protocolos para atuação do Sistema
Estadual de Segurança Pública, que envolvem ações prévias para resguardar a
segurança dos cidadãos na área a ser reintegrada a posse e dos servidores do
SIEDS (Sistema de Segurança Pública e Defesa Social do Pará) no momento da
execução da decisão judicial”.
Fonte: O Liberal