Foto: Osvaldo de Lima |
Comunidades que
vivem na região sudoeste do Pará denunciam os impactos sofridos por indígenas,
pescadores e moradores de cidades como Altamira, com a construção da usina
hidrelétrica de Belo Monte. O empreendimento foi erguido no meio do rio Xingu,
uma área onde, tradicionalmente, para obter a geração de energia é necessário
usar óleo diesel, combustível com alto poder poluidor. As informações são do G1
Pará.
“Dez
por cento da água do mundo corre nos rios brasileiros. E portanto, temos muito
potencial hidrelétrico a desenvolver. Não somos um país rico pra descartar uma
fonte de energia como essa”, explica o professor da Unicamp Secundino Soares
Filho.
Porém,
esse trecho da Amazônica revela-se bastante sensível do ponto de vista
ambiental e social, já que índios e pescadores dependem do rio para garantir a
sua sobrevivência.
“Desde
2008, 2009, quando o Governo se propõe a instalar essa hidrelétrica, o alerta
foi de que a região era uma região de precária presença do Estado, de carência
mesmo”, esclarece Thaís Santi, procuradora da República.
Hospital novo e sem
pacientes
Diante da pouca presença do poder público da área, os impactos seriam
inevitáveis, por isso, quem construísse a usina deveria trazer também várias
melhorias, como o saneamento básico, além de se preocupar com a natureza e com
o aumento da população, devido ao número de trabalhadores que seriam atraídos
para o local.
As
obras na hidrelétrica começaram em 2011 e custaram R$ 31 bilhões.
“Viveu-se
aqui momentos de glória. Comércio em alta, todo mundo trabalhando, todo mundo
ganhando dinheiro”, conta Milton Elias Fisher, presidente da Associação
Comercial de Altamira.
Em
abril deste ano, o empreendimento começou a funcionar com 5% da capacidade. Mas
a Norte Energia, empresa responsável pela usina, e a Prefeitura de Altamira,
cidade mais próxima da barragem, não chegam a um consenso. Por isso, muitos
programas que deveriam melhorar a vida de quem teve a rotina alterada por Belo
Monte anda não foram concluídos. Escolas e hospitais, por exemplo, são novos,
entretanto, não recebem ninguém.
“O
que existe é uma priorização na execução do cronograma da obra. E esse mesmo
esforço não é investido no atendimento das condicionantes que precisariam
preparar a região pra receber uma obra desse porte”, justifica Carolina Reis,
advogada do Instituto Socioambiental.
Danos ao meio
ambiente
A região próxima à barragem da usina de Belo Monte, conhecida como Volta Grande
do Xingu, com sua área de cerca de 100 quilômetros, é uma das que mais
preocupam ambientalistas, ribeirinhos, índios. Eles afirmam que as alterações
no curso do rio já começaram a provocar danos ambientais e sociais.
“Conforme
vai aumentando a profundidade, o oxigênio vai diminuindo”, afirma Cristiane
Costa Carneiro, bióloga da Universidade Federal do Pará, que analisa a água do
local.
“Antes,
a gente pescava para se alimentar e para vender. Hoje, só para se alimentar, e
é difícil ainda”, lamenta o índio juruna Jair Pereira.
Para
compensar os danos sociais provocados pela hidrelétrica, o Instituto Brasileiro
do Meio Ambiente (Ibama) exigiu, em 2011, que a Norte Energia implantasse integralmente
equipamentos de saúde e educação.
Uma
das obrigações da empresa responsável por Belo Monte foi a reforma e ampliação
do Hospital Geral de Altamira, para reforçar o atendimento no município com a
chegada de mais de 30 mil trabalhadores da usina. Mas a unidade só ficou pronta
em 2015 e até o momento o hospital ainda não foi inaugurado.
“Como
vamos transferir doentes pra um lugar que está incompleto? com enfermarias
incompletas, salas incompletas?” reclama Domingos Juvenil, prefeito de
Altamira.
“Reforçamos
toda a capacidade hospitalar da região. O que falta fazer é a transferência de
equipamentos para lá. Isso nós vamos fazer. Quem deve operar aquilo é quem
recebeu, é a Prefeitura. Nós não temos, como empreendedor, nenhuma obrigação
nem responsabilidade de administrar a coisa pública”, justifica Duílio Diniz de
Figueiredo, presidente da Norte Energia.
No
caso do hospital geral, o Ministério Público Federal (MPF) exige que a
Prefeitura e a empresa coloquem a unidade pra funcionar imediatamente.
Vidas remanejadas
Para a construção do lago de Belo Monte, 500 quilômetros quadrados foram
inundados: uma área do tamanho de Curitiba. Com a inundação, cerca de 10 mil
famílias tiveram que deixar para sempre suas casas.
A
técnica de enfermagem Vanderli Oliveira conta que sentiu os efeitos da mudança.
Segundo ela, o bairro onde vivia começou a inundar quando o lago da usina
começou a encher. A Norte Energia demoliu a casa de três dormitórios onde ela
morou a vida toda e pagou R$ 102 mil de indenização. Mas a técnica diz que o
dinheiro não dá para comprar uma casa perto da escola dos filhos e que irá
morar de aluguel.
“Arrasada.
Desestruturada. É como eu me sinto”, desabafa.
Já
o destino de mais de 4 mil famílias foi outro: 5 conjuntos habitacionais
construídos pela empresa responsável por Belo Monte. Apesar de novas, muitas
casas já têm problemas. Em uma delas é possível observar várias partes da
parede com massa corrida, cobrindo as várias rachaduras. A Norte Energia se
comprometeu a arrumar o problema e diz que vai consertar as rachaduras.
Sem saneamento
A cidade de Altamira não possui saneamento básico para seus 108 mil habitantes.
A rede de esgoto não é conectada às casas, por isso, a água cai direto no
meio-fio das ruas.
Antes
da construção da barragem, a sujeira acabava sendo levada pelo Xingu. Porém,
agora, o esgoto fica represado pela barragem. Em 2011, a Norte Energia se
comprometeu a fazer o esgotamento sanitário de Altamira até julho de 2014. A
tubulação nas ruas está pronta, mas não chega até as casas. A empresa culpa a
Prefeitura.
“A
prefeitura teve que criar, já que ficou com a responsabilidade de operação, de
criar uma empresa”, explica Duílio Diniz de Figueiredo, presidente da Norte
Energia.
“A
Norte Energia tá obrigada a não só fazer as ligações intradomiciliares, mas
também a operar todo o sistema de esgoto até que a Prefeitura consiga ter uma
estrutura, para evitar a poluição do reservatório do Xingu”, esclarece Marilene
Ramos, presidente do Ibama.
O
prazo dado à empresa é até novembro deste ano.
“Para
as casas, nós estamos contratando 15 empresas. Devemos iniciar as ligações no
início de junho”, promete o presidente da Norte.
Rastro de destruição
A margem do rio, quando fica inundada, é chamada pelos índios e ribeirinhos de
igapó. Essa área costuma ter muitos peixes que se alimentam dos frutos que caem
das árvores e ficam sobre o espelho dágua. Mas, segundo os jurunas, desde a
construção da barragem, esta região não fica mais inundada.
“Agora
que a água do Xingu foi desviada, os peixes não têm mais a cheia suficiente
para se alimentar” denuncia o cacique Giliard Juruna.
Segundo
o ibama, 16 toneladas de peixes morreram naquele trecho do Xingu, entre
novembro de 2015 e fevereiro de 2016.
“Você
teve água do reservatório, que é uma água de qualidade muito ruim por causa da
decomposição da matéria orgânica. Você tende a ter diminuição muito grande do
nível do oxigênio dissolvido”, esclarece Flávio Tadeu de Lima, pesquisador da
Unicamp, que estabelece uma ligação entre a morte de peixes e a
construção da usina.
Por
causa da mortandade de peixes, o Ibama multou a Norte Energia em R$ 35 milhões.
“Colocamos
aeradores, que são equipamentos que você aumenta o nível do oxigênio”, rebate o
presidente da Norte Energia.
Além
disso, a operação Lava Jato investiga se, na construção de Belo Monte, houve
pagamento de propina para políticos. O valor do desvio chegaria a R$ 150
milhões. Os suspeitos negam.
Hoje,
a usina gera energia para atender a 800 mil habitantes por dia. Quando estiver
funcionando plenamente, o que está previsto pra 2019, Belo Monte vai poder
abastecer as casas de 60 milhões de pessoas, diariamente.
“É
um projeto que, de fato, tem impactos ambientais importantes, mas que esses
impactos ambientais, em função de toda mobilização social que houve em torno
dele, acabou levando a que esses impactos fossem o mais possível compensados ou
bastante reduzidos. Além disso, Belo Monte tá gerando energia, uma energia que
hoje o país precisa muito”, afirma a presidente do Ibama.
“O
crescimento nosso tem sido de uns 3 por cento, 4 por cento, o que dá mais ou
menos uma Belo Monte por ano de aumento de consumo”, alerta Secundino Soares
Filho, professor da Unicamp.
“Gostaria
que a sociedade brasileira verificasse qual foi o empreendimento que investiu
4,6 bilhões de reais em melhorias da sociedade. Esse legado para o povo
brasileiro, que é a usina”, justifica Duílio de Figueiredo.
“Eeu
me sinto muito prejudicado e para nós é uma tristeza isso”, lamenta o pescador
Raimundo dos Santos Martins.
“Foi
prometido um lugar bonito, uma cidade boa para se viver. Essa cidade, por
enquanto, não chegou”, comenta Milton Elias Fisher, presidente da Associação
Comercial de Altamira.
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