Custo da Justiça no Brasil é recorde. Brasileiros pagam muito
por uma burocracia cuja característica é a lentidão, com 70% de
congestionamento nos tribunais
Dias atrás, Ricardo
Lewandowski, presidente do Supremo Tribunal Federal, atravessava o restaurante
quando ouviu uma voz feminina: — Ô, ministro! Ele parou, sorriu e estendeu a
mão para a mulher na mesa: “Olá, como vai?” Ela respondeu ao gesto: “Parabéns.
A sociedade brasileira congratula Vossa Excelência pelo julgamento do mensalão
e por aumentar os próprios benefícios agora nesse momento social tão
importante...”
Lewandowski
percebeu a ironia, manteve o sorriso, e seguiu. A cena está na rede. Tem valor
simbólico sobre a percepção coletiva do alto custo e da baixa eficiência da
administração da Justiça, no debate sobre o tamanho da burocracia que a
sociedade pode e/ou deseja sustentar.
O Brasil mantém a
Justiça mais cara do planeta, comprovam os pesquisadores Luciano Da Ros, da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e Matthew M. Taylor, da American
University, que mapeiam as mudanças no sistema judicial a partir da
redemocratização do país. O Poder Judiciário consome anualmente 1,3% do Produto
Interno Bruto, ou 2,7% de tudo que é gasto pela União, pelos estados e
municípios.
Significa uma
despesa anual de R$ 306,35 (US$ 91,2) no bolso de cada um dos 200 milhões de
habitantes. Esse nível de gasto com o Judiciário só é encontrado na Suíça, cuja
população é 25 vezes menor e a renda, cinco vezes maior. O custo brasileiro
aumenta quando somado o orçamento do Ministério Público, que não dá
transparência às suas despesas. Vai a 1,8% do PIB, o equivalente a R$ 87
bilhões (US$ 26,3 bilhões).
Supera o orçamento
de metade dos estados. É o dobro das obras contratadas pelo governo federal,
até abril, nas áreas de Transportes, Saneamento, Habitação e Urbanização. Caro
demais, ressaltam os pesquisadores, para quem o orçamento do Judiciário
brasileiro é o mais alto por habitante no Ocidente. Essas instituições do
Brasil custam 11 vezes mais que as da Espanha; dez vezes mais que na Argentina;
nove vezes mais que nos EUA e Inglaterra; seis vezes mais que na Itália, na
Colômbia e no Chile; quatro vezes mais que em Portugal, Alemanha e Venezuela.
Coisa semelhante,
só na Bósnia-Herzegovina e em El Salvador. Cada decisão judicial no Brasil (US$
681,4) é, na média, 34% mais cara que na Itália (US$ 508,8). Da Ros e Taylor
continuam tentando entender por que os brasileiros pagam tão caro por um
serviço judiciário cuja característica é a lentidão, onde dois em cada três
processos remancham nos tribunais e alguns demoram mais que uma vida para
julgamento.
Pelo ângulo estrito
da despesa, verificaram o peso da enorme força de trabalho do sistema de
justiça nacional. São 412.500 funcionários, o equivalente a 205 servidores por
100 mil habitantes — são 25 por cada um dos 16.500 juízes. Proporcionalmente, o
Brasil tem cinco vezes mais funcionários no Judiciário do que a Inglaterra, e
quatro vezes acima do que têm Itália, Colômbia e Chile.
A pesquisa
prossegue, com foco no histórico dessa burocracia, cujo custo para a sociedade
se multiplica pela ineficiência. Em torno dela gravita uma indústria com 880
mil advogados registrados (300% mais que na década de 90) e 1.100 faculdades
produzindo anualmente 95 mil novos bacharéis. Esse número de escolas é cinco
vezes maior do que nos EUA, onde se for- mam 45 mil por ano.
Por: José Casado
Fonte: O Globo
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