Manutenção do modo de vida das comunidades e garantia de retorno
e permanência no rio são prioridades da discussão, que envolve autoridades,
moradores e cientistas.
Construção de barraco de lona foi opção encontrada por família ribeirinha como forma de voltar a viver perto do rio (foto: equipe de inspeção interinstitucional, em junho de 2015) |
O Ministério Público Federal (MPF) convoca uma
audiência pública para o próximo dia 11 de novembro, em Altamira (PA), para
definir o retorno dos ribeirinhos ao Rio Xingu e debater as condições
necessárias para a reprodução do modo de vida ribeirinho na região, diante dos
impactos não resolvidos da hidrelétrica de Belo Monte. O MPF pretende chamar os
responsáveis para proteger a área do Rio Xingu que teve sua condição ecológica
totalmente modificada devido às alterações acarretadas pela usina, que hoje
inviabilizam a manutenção dos modos de vida.
A situação afeta igualmente indígenas e não
indígenas, mas, no caso dos ribeirinhos, o licenciamento ambiental não garantiu
nenhum programa de mitigação que contemple as mudanças em suas vidas. “Esse grupo
foi invizibilizado no processo de licenciamento da hidrelétrica”, diz o edital
do MPF convocando a audiência pública. O edital relata as investigações em
curso no MPF sobre os três grupos de ribeirinhos atingidos gravemente por Belo
Monte: indígenas e não indígenas da Volta Grande do Xingu e ribeirinhos das
ilhas e beiradões.
As investigações, diz o MPF, “levam à conclusão de
que a implementação da hidrelétrica de Belo Monte vem acompanhada de um
processo de expulsão silenciosa das populações ribeirinhas do Rio Xingu e de
que os impactos não mitigados merecem efetiva e imediata ação reparatória por
parte do governo federal e do concessionário empreendedor”.
Os moradores das margens do Rio Xingu, na área onde
hoje fica o reservatório de Belo Monte, sofreram um processo violento de
remoção compulsória no ano de 2015, quando a Norte Energia, empresa responsável
pela usina de Belo Monte, passou a retirá-los sem considerar as peculiaridades
de seu modo de vida, que dependia do rio e da cidade. Pessoas que viveram
sempre de pesca e agricultura foram removidas, com indenizações irrisórias, e
passaram a ocupar áreas periféricas no núcleo urbano de Altamira, longe do rio
e de qualquer possibilidade de reconstruir suas vidas.
Em junho de 2015, por iniciativa do MPF, membros do
Conselho Nacional de Direitos Humanos, das diversas instituições envolvidas no
licenciamento de Belo Monte, pesquisadores de várias universidades brasileiras
e jornalistas realizaram inspeção nas comunidades que estavam sofrendo remoção
e constataram graves violações de direitos humanos. A inspeção resultou em um
relatório e na decisão do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) de
interromper as remoções para assegurar respeito aos ribeirinhos.
Mais de um ano depois, a situação ainda não teve
uma solução satisfatória. A licença de operação de Belo Monte foi emitida sem
que a questão dos ribeirinhos fosse resolvida. E a concessionária Norte Energia
iniciou um processo de reocupação do reservatório do Xingu, sem estudos
técnicos sobre o modo de vida rompido e sem a aquisição de áreas capazes de
garantir a reconstrução da vida ribeirinha em um ambiente ecologicamente
modificado. As violações também são graves na região da Volta Grande do Xingu,
onde não houve remoção de moradores, mas alteração brutal dos ecossistemas, com
o desvio de mais de 80% da água do rio para movimentar as turbinas da usina. A
região, batizada nos documentos do licenciamento ambiental de Trecho de Vazão
Reduzida (TVR), não oferece mais condições ecológicas de sustentar as famílias
ribeirinhas, tanto indígenas quanto não indígenas.
A audiência pública será precedida de reuniões
técnicas e estudo de campo nas áreas ribeirinhas, com a participação de equipe
multidisciplinar constituída em reunião realizada na sede da Sociedade
Brasileira para o Progresso da Ciência (SPBC), em São Paulo. O estudo será
necessário para embasar a ocupação e uso da beira do Rio Xingu pelas populações
tradicionais expropriadas e em processo de expropriação pela usina de Belo
Monte. O MPF convidou para a audiência pública as seguintes autoridades e
instituições: Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência; Casa Civil e
Secretaria de Governo da Presidência da República; Estado do Pará, Município de
Altamira; Ministério do Meio Ambiente; Secretaria de Direitos Humanos da
Presidência da República; Conselho Nacional de Direitos Humanos; Instituto
Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis; Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade; Fundação Nacional do Índio, Agência
Nacional de Energia Elétrica; Agência Nacional de Águas; Secretaria de
Patrimônio da União; Concessionária Norte Energia S/A e órgãos representativos
das populações tradicionais extrativistas.
Fonte: MPF
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