Brasil Novo Notícias: Onze anos após assassinato de Dorothy Stang, mortes em Anapu disparam

terça-feira, 19 de abril de 2016

Onze anos após assassinato de Dorothy Stang, mortes em Anapu disparam

Com sete mortes registradas em 2015, de acordo com dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT) divulgados na sexta-feira (15), o município de Anapu, no sudoeste do Pará, volta a chamar atenção pela violência decorrente da disputa por terras.
O ano passado foi o mais violento dos últimos 12 anos no meio rural brasileiro, com 50 mortes motivadas por conflitos agrários, segundo os Cadernos de Conflitos no Campo publicados nesta sexta-feira pela CPT, confirmando dados parciais adiantados em janeiro. A maior parte dos homicídios ocorreu em Rondônia (20) e no Pará (19). Além das mortes, a pastoral registrou 59 tentativas de assassinato no ano passado.
Os dados mostram ainda que nos quatro primeiros meses de 2016, já foram registrados 13 homicídios e atualmente há no país 144 pessoas ameaçadas de morte devido a conflitos no campo.
Entre os mortos no ano passado está Wilson Gonçalves Barbosa, funcionário contratado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para trabalhar na guarita de acesso ao Projeto de Desenvolvimento Sustentável Esperança, no qual a missionária norte-americana Dorothy Stang trabalhava e onde foi assassinada em fevereiro de 2005.
Outras cinco mortes estão ligadas ao lote 83 da gleba Bacajá/Mata Preta, uma área pública que aguarda regularização para reforma agrária e cuja propriedade é reivindicada por Regivaldo Pereira Galvão, condenado pelo Tribunal de Justiça do Pará a 30 anos de prisão, após ter sido considerado o principal mandante da morte de Dorothy.
Impunidade
Após permanecer 1 ano e 4 meses preso, o “Taradão”, como Galvão ficou conhecido na região, aguarda em liberdade por julgamento de recurso, beneficiado por um habeas corpus concedido em 2012 pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

A impunidade é um dos principais fatores apontados pela pastoral para o recrudescimento da violência no campo. Segundo dados da entidade, de 1.115 casos de homicídio decorrentes de conflitos no campo registrados entre 1985 e 2014, apenas 12 foram julgados.
Outra razão apontada pela pastoral é a redução de áreas desapropriadas para a reforma agrária observada nos últimos anos. Em 2015, pela primeira vez desde a redemocratização do país, não foi assinado nenhum decreto presidencial de desapropriação de imóveis rurais, de acordo com dados do Incra.
Dados discrepantes
A Ouvidoria Agrária Nacional (OAN), órgão ligado ao Ministério do Desenvolvimento Agrário, contesta os dados da Comissão Pastoral da Terra e afirma que, de acordo com suas próprias estatísticas, ocorreram 16 mortes no campo brasileiro em 2015.
A pastoral da terra diz que a discrepância se dá porque a OAN considera apenas dados oficiais provenientes de inquéritos da Polícia Civil e do Ministério da Justiça, mas que em muitos casos as mortes no campo sequer chegam a ser investigadas adequadamente.
“Não é verdade que as mortes no campo não são investigadas”, rebateu o ouvidor agrário nacional, desembargador Gercino José da Silva Filho, àAgência Brasil. “Nós da OAN podemos apontar o inquérito, a denúncia e o processo, então nossos dados são objetivos, reais, concretos e fáceis de apontar, o que nem sempre acontece com os dados da pastoral.”
A coordenadora nacional da comissão pastoral, Jeane Belline, alega, no entanto, que nos últimos anos os mandantes dos crimes mudaram sua estratégia e passaram a ocorrer mais mortes no meio urbano, em uma tentativa de descaracterizar os crimes como sendo ligados a conflitos agrários.
“Mesmo que seja por motivos de luta pela terra, eles procuram pegar as lideranças fora de suas áreas, quando vão fazer compras na cidade, abastecer a moto, qualquer coisa para descaracterizar”, disse Jeane à Agência Brasil. “Parece que é uma forma de livrar o Estado da obrigação de fazer algo mais eficaz na resolução de conflitos de terra”, afirmou.
O desembargador Gercino reconheceu que a tensão aumentou no meio rural: “Os motivos principais são a existência de terras públicas federais que se encontram griladas por grandes posseiros e a questão do desmatamento, principalmente por madeireiras clandestinas.”
Dorothy Stang
A missionária Dorothy Stang chegou ao Brasil nos anos 1970 para realizar trabalhos pastorais na região amazônica. Sua atuação focou projetos de reflorestamento e de geração de emprego e renda para a população pobre local. Foi assassinada aos 73 anos e sua morte se tornou um símbolo da luta por reforma agrária planejada e responsável, que visasse minimizar conflitos violentos, uma de suas principais bandeiras.
Fonte: O Xingu

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